Ações sustentáveis na produção de ovos

Introdução

A busca por indicadores de sustentabilidade nas cadeias produtivas tornou-se urgente em função da crescente exigência dos consumidores por informações que antes não eram consideradas na escolha de um produto, levando-se em conta as implicações éticas e ambientais na produção de um alimento, agora observados como atributos essenciais de qualidade e segurança alimentar.

Como definição geral e simplificada, os sistemas sustentáveis de produção de alimentos devem ser socialmente responsáveis, economicamente viáveis, garantir a saúde e o bem-estar humanos e animal, e a proteção ao meio-ambiente. Dentro desse contexto, as agroindústrias vem adaptando-se às mudanças, no sentido de atender às exigências dos mercados através da implementação de práticas sustentáveis na produção de alimentos.

Ações objetivas para alcance dos propósitos de sustentabilidade na produção de alimentos devem basear-se em princípios de boas-práticas de produção (BPP) considerando a abordagem integral ("from farm to fork"), que tem evoluído para uma estratégia ainda mais abrangente, "from gene to fork" em termos das implicações dos conceitos de rastreabilidade e transparência em toda a cadeia produtiva.

Conforme definição da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations) existe dez categorias ou programas a serem trabalhados dentro do escopo das boas práticas:

  • Conservação do solo
  • Uso da água
  • Produção vegetal
  • Produção animal
  • Proteção ambiental
  • Proteção animal (Bem-Estar animal)
  • Manejo e Processamento
  • Higiene e saúde humana
  • Eliminação de resíduos e conservação de energia
  • Proteção à fauna selvagem

Muitas práticas como a utilização da água, eliminação de resíduos, conservação de energia, saúde humana e higiene são comuns às atividades de produção agropecuárias e constituem-se nos estágios iniciais para implantação de um sistema pró-ativo no estabelecimento de melhorias e ações sustentáveis dentro das cadeias produtivas.

Numa abordagem generalizada, os estágios ou etapas para definição de indicadores de sustentabilidade em sistemas de produção de alimentos estão resumidos na Tabela 1.

Contextualização: sustentabilidade em sistemas agroalimentares

A intensificação da produção de ovos ocorrida logo após a larga adoção de baterias de gaiolas resultou na automatização da distribuição da ração, água, coleta de ovos e esterco e em consequência ocorrreram melhorias na higiene, nutrição e "status" sanitário das aves.

A seleção genética das linhagens de corte e postura também se intensificou e estima-se que os índices produtivos tenham se elevado em mais de 85% nos últimos 50 anos. Paralelamente a esse crescimento, observou-se um aumento na incidência de doenças relacionadas á intensificação tanto em linhagens de corte quanto de postura. Alguns exemplos incluem os problemas circulatórios e de pernas em frangos de corte e, em poedeiras, doenças metabólicas multifatoriais como a osteoporose e problemas de comportamento e bem-estar animal como o canibalismo.

Também tem sido observada uma maior incidência de patógenos emergentes, considerando estarem favorecidas as condições de sobrevivência no ambiente e a habilidade dos microorganismos em modificarem suas atividades de acordo com as mudanças que possibilitam seu desenvolvimento. Uma característica comum na emergência de doenças e patógenos associados ao consumo de alimentos de origem animal é o papel fundamental da aplicação de boas práticas de higiene e limpeza, desde os primeiros estágios de produção.

As modificações nas práticas de criação animal e industrialização têm um papel fundamental na disseminação de microorganismos patogênicos transmitidos aos seres humanos através do consumo de produtos de origem animal "in natura" ou processado.

Particularmente, durante o último século, a mecanização, a introdução de fertilizantes sintéticos e de pesticidas, além do uso de variedades agronômicas resistentes e de alto rendimento, conduziu à alta produtividade na agricultura, o que positivamente contribuiu para o aumento da disponibilidade de alimentos em todo o mundo.

Problemas ambientais surgiram devido ás práticas adotadas no cultivo e colheita, associados ao uso excessivo de nutrientes no solo e no manejo como, por exemplo, a erosão, acúmulo de metais pesados, compactação do solo, entre outros.

Na busca de soluções, surgiu a proposição de uma "agricultura orgânica" como alternativa á agricultura convencional objetivando-se evitar as consequências deletérias ao meio-ambiente. No entanto, hoje se observa que muitos dos problemas ambientais consequentes de práticas agrícolas convencionais também estão presentes nos sistemas de produção orgânica.

Nos sistemas produtivos avícolas, há o desafio da reciclagem dos resíduos da produção como camas de aviário, excretas, aves mortas. Somam-se às consequências da intensificação da produção animal, os danos causados ao meio-ambiente, em função do uso excessivo desses resíduos gerados pela atividade e que após processados, são destinados ao emprego em culturas e adubação dos solos.

A utilização desses resíduos na produção de biocombustíveis tem sido apontada como solução tecnológica ao problema da disposição e uso dos mesmos de modo sustentável, no entanto, sua larga adoção irá depender de políticas públicas e fomentos na execução e validação de pesquisas.

Do mesmo modo que na agricultura, a preocupação com os sistemas intensivos de produção de ovos estimulou a busca por alternativas como a "produção orgânica" associada aos sistemas considerados "extensivos". No entanto, indicadores de sustentabilidade apontam favoravelmente para o sistema de produção de ovos em sistemas convencionais (gaiolas) devido à maior higiene proporcionada por esse tipo de alojamento e menor suscetibilidade à enfermidades que seriam facilmente disseminadas em sistemas de criação extensivos, onde ocorre o contato mais heterogêneo entre as aves e a exposição frequente às excretas (Boer e Cornelissen, 2002). Em concordância, Andersson et al. (2005) indicaram que a produção orgânica não demonstrou ser competitiva em relação às práticas convencionais considerando o impacto ambiental e qualidade do produto sob a ótica da sustentabilidade.

Quando se considera a produção de alimentos de qualidade, voltada para práticas sustentáveis, devem ser levados em conta a segurança do produto e os procedimentos adotados em sua obtenção. Um aspecto importante em relação ao fator econômico quando se comparam os sistemas não-convencionais (alternativos) com os sistemas convencionais é o fato de os primeiros serem competitivos apenas se houver mudança nos hábitos de consumo, atrelando-se o custo agregado no desenvolvimento da produção sustentável desse alimento.

As demandas do mercado consumidor considerando elementos de qualidade intrínseca do alimento (qualidade sensorial), segurança e de sustentabilidade fora sumarizadas por Andersen et al. (2005) e estao indicadas na Tabela 2.

Implementando práticas sustentáveis na produção de ovos

Adoção de Boas Práticas de Produção

Os avanços em práticas sustentáveis nas cadeias produtivas exigem o conhecimento integral das relações entre as atividades de processamento do alimento e práticas de produção animal e vegetal. Assim, mecanismos de controle de qualidade como a padronização de procedimentos operacionais, a aplicação de boas práticas de produção (BPP) e da rastreabilidade surgiram, no intuito de minimizar os efeitos deletérios da intensificação da produção e incorporar elementos de impacto na valoração das ações sustentáveis nos sistemas produtivos.

A concepção de rastreabilidade tem como base a adoção das Boas Práticas de Produção/Fabricação (BPP/BPF), de programas como "Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controle" (ACCP), "Programa de Alimentos Seguros" (PAS) e "Procedimento Padrão de Higiene Operacional" (PPHO) em toda a cadeia produtiva. Tais programas garantem a rastreabilidade justamente por agregar medidas de monitoramento e controle na forma de registros/certificações que satisfazem exigências sanitárias, de boas práticas de produção/ fabricação e de obtenção de alimentos seguros.

Uma preocupação recente tem sido a de introduzir conceitos relacionados ao bem-estar animal em protocolos de boas práticas de produção. Esse fato é um reflexo das discussões que vem ocorrendo nas cadeias de produção de proteína animal. A definição de bem-estar animal envolve ambas as considerações, éticas e científicas e ainda existem muitos pontos de vista conflitantes sobre o assunto. A tendência nos mercados para garantir e satisfazer as exigências em bem-estar animal se insere dentro do conceito da rastreabilidade e prioriza os princípios de boas práticas de produção.

Algumas atividades de produção adotadas na cadeia produtiva de ovos têm gerado controvérsias frente a percepção pública e o manejo convencional e alojamento praticados comercialmente, como por exemplo, a debicagem das aves, aplicação de muda induzida, o tipo de gaiola e densidade de alojamento (nº de aves/gaiola), transporte das aves e depopulação de aviários vêm recebendo maior atenção uma vez que são atividades que têm gerado discussões sobre o bem-estar de poedeiras em sistemas de criação intensivos.

Há uma orientação crescente para o banimento progressivo de práticas e modelos de produção existentes nos sistemas intensivos comerciais criando-se a necessidade da geração de indicadores sustentáveis de bem-estar animal na produção de ovos.

Várias pesquisas vêm sendo conduzidas objetivando-se uma abordagem com foco em práticas sustentáveis e sinalizando para a viabilidade da atividade de postura comercial. Alguns resultados sobre a temática do bem-estar animal são em sua maioria de caráter multidisciplinar e possuem conexão com objetivos e ações sustentáveis. Alguns desses resultados são indicados a seguir:

Gaiolas e densidade de alojamento: Estudos têm demonstrado que a redução do espaço por ave em gaiolas, abaixo de 350 cm2 significativamente tem impacto negativo sobre a postura além de aumentar a mortalidade no lote (United Egg Producers-UEP, 2005). A União Européia (CEC, 1999), tem recomendado desde 2003 em sistemas de gaiolas convencionais, um mínimo de 550 cm2 de área por ave e, em sistemas de gaiolas enriquecidas, pelo menos 750 cm2 de área/ave sendo 600 cm2 a área mínima utilizável, disponível nesse mesmo tipo de gaiola. A UE aprovou dentro da diretiva CEC (1999), o banimento de gaiolas convencionais dos sistemas de produção a partir do ano 2012, não permitindo qualquer investimento nesse tipo de gaiola desde o ano de 2003.

As principais vantagens e desvantagens da larga adoção de gaiolas nos sistemas intensivos foram resumidas por Duncan (2001):

Vantagens: 1) melhor higiene, o que decisivamente resultou em menor incidência de doenças infecciosas num lote; 2) facilidade de manejo; 3) menores custos de produção, entre outros;

Desvantagens: 1) redução do espaço físico e restrição de movimentos, o que veio a influir na manifestação de desordens metabólicas ("fadiga de gaiola" e osteoporose); 2) menor oportunidade para a manifestação do comportamento natural favorável ao bem-estar das aves

O design das gaiolas e sistemas de "enriquecimento ambiental" das mesmas são também elementos importantes no bem-estar das poedeiras. Gaiolas modificadas (que incluam poleiros, ninhos e/ou banhos de areia) fornecem oportunidade para as aves desempenharem seu comportamento natural de maneira a usufruirem de maior bem-estar. A presença de poleiros em gaiolas, por exemplo, está associada à redução na incidência de fraturas em poedeiras. Gaiolas com poleiros possibilitam maior oportunidade para o exercício físico e indicaram ser benéficas à mineralização óssea e resistência à fraturas (Gregory et al., 1991; Kopka et al., 2003). Uma vantagem extra da presença de poleiros foi a redução no canibalismo durante o período de postura (Gunnarsson et al., 1999).

Devido à preocupação do consumidor com o modo de criação de poedeiras comerciais, grandes corporações como McDonald's, um comprador de 1 bilhão de ovos/ano, exigiram modificações em práticas e no tipo de alojamento de poedeiras comerciais de seus fornecedores a nível global.

Os sistemas alternativos de alojamento de poedeiras, baseados em maior espaço e oportunidade para manifestação do comportamento natural das aves possuem melhor conexão com a aceitação pública, no entanto, sob a ótica científica, pesquisas com gaiolas modificadas ainda se encontram em fase preliminar, não havendo ainda a recomendação para plena adoção na indústria.

Muda induzida em poedeiras comerciais: A muda é um processo normal em aves domésticas e selvagens, no entanto para as primeiras, o padrão de muda possue um aspecto diferenciado. Aves domésticas foram selecionadas ao longo do tempo para o alto desempenho produtivo, num ambiente em que flutuações sazonais foram eliminadas. Desse modo, por meios artificiais que mimetizam as mudanças no ambiente (redução do fotoperíodo, por exemplo), todas as aves num lote são induzidas à muda ao mesmo tempo, assim propiciando uma padronização no período em que o lote estaria fora da produção e posteriormente retornando à postura. Com a muda induzida, as aves cessam sua produção de ovos permitindo que haja um período de descanso ao ovário, quando há rejuvenescimento das células e tecidos. Posteriormente o desempenho produtivo é melhorado, quando então as aves são re-estimuladas à postura ao final do programa de muda. Um programa de muda convencional comumente utilizado na indústria geralmente envolve a retirada da ração por determinado período, em conjunto com a redução do fotoperíodo.

Questões de rastreabilidade destacadas em protocolos de certificação de boas práticas, envolvendo os programas de muda induzida dizem respeito não só ao bem-estar animal devido ao período em que as aves permanecem em jejum, mas também à segurança alimentar uma vez que poedeiras em muda convencional demonstraram maior susceptibilidade a infecções bacterianas e consequente contaminação dos ovos (Park et al., 2004, Murase et al., 2006; Dunkley et al., 2007). Uma outra questão relacionada ao bem-estar das aves durante a muda está relacionado ao decréscimo na integridade óssea (Mazzuco e Hester, 2005a).

Em alguns mercados internacionais, produtores de ovos como o dos Estados Unidos, admite-se a necessidade de introduzir novos protocolos de muda, que venham substituir programas convencionais e proporcionem desempenho similar aos programas mais eficientes em termos de produção e qualidade do ovo.

Seguindo as demandas da UEP, a comunidade científica americana foi desafiada a desenvolver alternativas viáveis de programas de muda enfatizando o bem-estar das poedeiras. Como consequência, novas práticas de manejo e alimentação tornaram-se disponíveis como já relatado em alguns protocolos de muda alternativos, mostrando resultados satisfatórios no desempenho produtivo e atendendo a exigências de bem-estar animal (Biggs et al., 2003; 2004; Mazzuco e Hester, 2005b; Woodward et al., 2005;. Kim et al., 2006).

Transporte e depopulação de aviários: Os ossos tornam-se fragilizados devido à constante retirada do Ca ósseo, depositado na casca dos ovos durante sua formação no oviduto. Como conseqüência, as linhagens de aves destinadas à postura comercial apresentam seu esqueleto bastante fragilizado ao final do período de postura. Em função disso, há grande risco de fraturas ósseas ocorrerem quando as aves são retiradas das gaiolas durante a depopulação dos aviários e posteriormente, durante o transporte e abate. Recomendações de boas práticas de manejo durante a depopulação e transporte das aves foram indicadas pela UEP (2005) no intuíto de minimizar a incidência de fraturas ou outras injúrias às aves. Algumas das recomendações incluem:

- a remoção das aves das gaiolas deve ser efetuada por equipe treinada; as aves devem ser retiradas das gaiolas e imobilizadas por ambas as pernas;

- redução da luminosidade no interior do aviário para minimizar a agitação das aves durante esse procedimento;

- o jejum/retirada da ração anterior à depopulação do aviário e transporte não deve ser superior a 24 horas.

As Diretivas da Uniao Européia (CEC, 1999), também dizem respeito ao espaço por ave nos veículos de transporte até o abatedouro na dependência do peso corporal, além da preocupação com o fornecimento de alimento e água em jornadas de transporte acima de um período de 12 horas.

Debicagem e Canibalismo: O canibalismo é um dos principais problemas relacionados ao bem estar de poedeiras comerciais sendo observado com maior frequência em sistemas de criação intensivos, no entanto, é também um comportamento imprevisível em sistemas extensivos de criação. Um "surto" ou manifestação massiva de canibalismo num lote de aves pode resultar em alta mortalidade. Múltiplos fatores podem influenciar a manifestação desse comportamento nas aves como, por exemplo, a forma do bico, a intensidade da luz utilizada, predisposição genética para agressividade, idade, nutrição, densidade na gaiola/piso, hierarquia de aves dominante-agressivas dentro do grupo, entre outros.

Na postura comercial, o canibalismo é reduzido num lote quando as aves são debicadas. A debicagem é uma prática de manejo comum na avicultura comercial e basicamente consiste no corte de 2/3 do bico superior e pouco menos do bico inferior através de máquinas debicadoras que utilizam lâminas aquecidas.

A prática da debicagem em poedeiras comerciais está para ser banida em alguns países da UE e não será permitida na Inglaterra após o ano de 2010, (WOFA Regulations, 2002). Adicionalmente, com a Diretiva de 1999 (CEC, 1999) da UE, gaiolas convencionais serão banidas definitivamente do sistema comercial de produção de ovos até o ano de 2012 e, conforme indicado por Newberry (2004), maior número de pesquisas deverão estar focados no estudo do controle do canibalismo em sistemas de criação extensivos e gaiolas "enriquecidas".

A seleção genética para produção de ovos indiretamente veio associada às características negativas de comportamento como a agressividade em determinadas linhagens. A influência do background genético no comportamento das aves é exemplificada na manifestação do canibalismo, que possuí herdabilidade de 0.05 a 0.50 (Kjaer e Sorensen, 1997; Rodemburg et al., 2003). Com o rápido desenvolvimento da genética molecular, estudos de QTL (Quantitative Trait Loci) em comportamento animal indicaram um total de 30 QTL envolvidas em características de canibalismo em poedeiras (Buitenhuis et al., 2005).

Embora maior número de pesquisas seja necessário para se determinar a melhor idade para efetuar a primeira debicagem em aves comerciais, resultados em termos de desempenho e bem-estar indicam que a primeira debicagem deve ser efetuada até os 10 dias de idade e por mão-de-obra capacitada. Uma segunda debicagem às vezes é necessária, o que geralmente é feito entre 5 a 8 semanas de idade das aves porém, quando a primeira debicagem é adequadamente efetuada, um segundo corte do bico não se faz necessário.

A solução genética aos problemas de bem-estar causados pelo canibalismo tem sido a mais desejável na atualidade, considerando que a debicagem também implica em mudanças de comportamento que vem afetar negativamente o bem-estar. Não há dúvida que na ocorrência de um "surto" de canibalismo num lote, haverá grande comprometimento do bem-estar das aves contudo, com a prática da debicagem isto pode ser controlado.

Estudos em Genômica

Um exemplo em ação sustentável refere-se à adoção de programas de melhoramento na seleção genética das atuais linhagens adotadas nas cadeias avícolas tendo em vista a sustentabilidade. Estudos de genômica associados às análises de comportamento e dados de etologia vêm oferecer oportunidades de avanço no estudo da relação entre comportamento e produção, predizendo possíveis efeitos (adicionais, negativos ou não) dos programas de seleção genética, (Jensen e Andersson, 2005).

Uma abordagem inovadora é a aplicação de conceitos de genômica na solução de problemas sanitários e de bem-estar animal e suas implicações na qualidade e segurança alimentar e perspectivas de uma produção sustentavel. A genômica aplicada à produção animal tem tido grande impacto na identificação de genes que controlam características zootécnicas de interesse pela indústria. Recentemente, estudos de QTL ("Quantitative Trait Loci") em aves comerciais mostraram grande aplicação na prospecção de genes de interesse e efeito em "características sustentáveis". Em frangos os parâmetros de imunologia tem sido utilizados para localizar QTLs envolvidos na resposta imunitária para doença de Newcastle, na resistência a organismos como E. coli, bem como em maior viabilidade (Yonash et al., 2001). A susceptibilidade à doença de Marek foi caracterizada através de diferenças detectadas na expressão gênica (DNA microarray) entre linhagens resistentes a Marek e aquelas suscetíveis (Liu et al., 2001). Em poedeiras comerciais, a produção e qualidade dos ovos são características complexas da seleção genética, muitas vezes correlacionadas negativamente com anormalidades ósseas. QTL associados às variáveis de qualidade de ovos, produção e peso corporal foram identificados em uma população de aves (F2), oriunda do cruzamento entre linhagens de corte e postura revelando genes específicos, importantes para o melhoramento das atuais linhagens comercias, (Schreiweis, 2005).

Biotecnologia

A preocupação com o ambiente tem fomentado a busca por alternativas na biotecnologia, não apenas para remoção de poluentes do ambiente, mas principalmente para evitar a geração de poluentes como medida altamente sustentável. A biotecnologia tem interagido com outras disciplinas criando uma interface altamente promissora e um exemplo de sucesso encontra-se em seu emprego na nutrição animal.

Um exemplo refere-se à aplicação da biotecnologia na produção de enzimas exógenas para uso na alimentação animal.

O uso das fitases já está consolidado na avicultura considerando sua função em aumentar a biodisponibilidade do fósforo (P) fítico presente nas dietas e consequentemente em economizar as fontes de P e reduzir a poluição ambiental (Gordon e Roland, 1997; Waldroup, 1999; Bertechini; 2006, Broz e Ward, 2007).

Implicações do uso de fitases na dieta de frangos e poedeiras e sua ação incremental na disponibilização de nutrientes estão bem documentadas em literatura e resumidamente incluem: melhor utilização do fósforo fítico, maior disponibilidade de Ca e Zn, maior digestibilidade de aminoácidos e aumento da energia metabolizável em função da redução de perdas endógenas (Broz e Ward, 2007).

Progressos na engenharia genética das fitases microbianas tem tornado a sua utilização favorável em termos de aplicação e custo; algumas fitases são derivadas de várias cepas de Aspergillus spp. e Trichoderma, tornando a especificidade de substrato uma característica essencial no aumento da eficácia in vivo de novas fitases (Broz e Ward, 2007). Pesquisas inovadoras na área das fitases microbianas deverão ser direcionadas no isolamento e desenvolvimento de produtos mais estáveis e termo-tolerantes.

A indústria tem buscado soluções também às fontes de cereais, limitadas em seu uso devido à presença de polissacarídeos não-amídicos (PNA) e assim, o emprego das carboidrases como as b-glucanases, a-galactosidases, xilanases entre outras, tem mostrado resultados positivos, aumentando a eficiência energética das rações em função da melhoria na digestibilidade dos nutrientes.

Os farelos de arroz e trigo, grãos de centeio, trigo, cevada e aveia têm sido utilizados com sucesso na dieta de poedeiras e frangos quando empregados em conjunto às carboidrases exógenas (Wyatt e Goodman, 1996; Cowieson e Adeola, 2005; Silversides et al., 2006).

Também na área da produção de proteínas animais, a biotecnologia vem de encontro aos anseios da sustentabilidade devido à crescente preocupação com o uso de antibióticos e suas implicações no desenvolvimento de resistência do organismo, presença de resíduos nos produtos finais e necessidade de substituir esses medicamentos devido ao seu banimento progressivo em alguns mercados.

Nesse contexto, o uso de probióticos e prebióticos tem-se mostrado promissor assegurando tanto a saúde das aves quanto o risco mínimo de contaminação dos produtos gerados nas cadeias avícolas. Conforme Saad (2004), probióticos são microorganismos vivos, administrados em quantidades adequadas e que conferem benefícios à saúde do hospedeiro; já os prebióticos, são carboidratos não-digeríveis, que afetam beneficamente o hospedeiro, por estimularem seletivamente a proliferação e/ou atividade de populações de bactérias desejáveis. Dessa forma, probióticos e prebióticos alteram a microbiota intestinal e têm demonstrado efeito sobre o sistema imunitário, modulando a fisiologia do tecido epitelial e sua habilidade em responder a desafios como estresses de diversas ordens, infecções e a colonização intestinal por patógenos, (Patterson e Burkholder, 2003).

Os prébioticos utilizados na nutrição animal incluem os carboidratos não-digeríveis, como a inulina e outros oligossacarídeos (oligofrutose e frutooligossacarídeos-FOS), que fornecem carboidratos às bactérias benéficas do intestino (Orban et al., 1997; Collins e Gibson, 1999; Dahiya et al., 2006; Bertechini, 2006).

As bactérias pertencentes ao gênero Lactobacillus, Bacillus, Enterococcus e fungos como Saccharomyces têm sido empregados na avicultura e a abordagem da competição exclusiva exemplifica o impacto da microbiota intestinal benéfica e seus efeitos positivos sobre a saúde intestinal e resistência a doenças desde os primeiros dias de vida da ave (Nisbet, 1998; Stern et al., 2001; Schneitz, 2004).

Considerações Finais

Quando o objetivo é inserir indicadores de sustentabilidade em sistemas de produção, deve-se criteriosamente serem avaliadas quais são as reais necessidades da sociedade e, estudos de impactos e demandas devem ter como objetivos específicos a garantia da produção de alimentos no longo prazo. Programas de capacitação, treinamento e atualização dos diferentes atores da cadeia produtiva devem ser constantes e são referenciais fundamentais dentro do contexto de sustentabilidade.

Avanços e ações sustentáveis no setor avícola só poderão ser alcançados quando conceitos e práticas estiverem harmonizados em toda a cadeia de produção e fomentados por políticas governamentais.

O desenvolvimento de processos adequados na obtenção de produtos de origem animal com reconhecida qualidade deve ter como base, orientações de boas práticas consistentes que garantam sua rastreabilidade e confiram competitividade ao produto final.

Num futuro de médio e longo prazo, toda a cadeia produtiva de ovos deverá ajustar-se a um novo cenário, no qual modificações e melhorias na infra-estrutura das instalações, novas práticas de manejo e manipulação das aves, novos índices de controle de produção e de monitoramento do plantel, novas responsabilidades sociais e ambientais entre outros serão como um todo, marcos referenciais de agregação de valor beneficiando o consumidor e garantindo sustentabilidade à atividade de postura comercial.

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Helenice Mazzuco, PhD

Pesquisadora Embrapa Suínos e Aves

Correspondências devem ser enviadas para: hmazzuco@cnpsa.br